terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Homossexuais assassinados no Brasil superou 250 casos em 2010

O número de homossexuais assassinados no Brasil superou 250 casos em 2010, um recorde histórico, conforme o Grupo Gay da Bahia (GGB). O dado faz parte do relatório anual - ainda em fase de conclusão - elaborado pela entidade e que será apresentado oficialmente em março.
Em entrevista, o fundador do GGB, Luiz Mott, destaca que foi a primeira vez que a quantidade de homicídios ultrapassa a casa das 200 notificações. Em 2009, foram 198, cerca de 50 a menos do que registrado no ano passado.

"Na década anterior, matava-se, em média, um homossexual a cada três dias. Nos últimos anos, essa média passou para um assassinato a cada um dia e meio. Há uma escalada que reflete a violência crescente no Brasil, sobretudo, no que se refere aos crimes letais. Em geral, a impunidade é grande, mas é maior quando a vítima é homossexual, já que as pessoas não querem se envolver, testemunhar. Ainda há muito tabu, muito preconceito", detalha o ativista.

Para Mott, o País convive com uma contradição na medida em que apresenta "mais de 150 paradas gays, abriga a maior associação de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT) da América Latina", mas, ao mesmo tempo, é líder mundial de mortes contra essa população. Segundo ele, "a homofobia cultural é forte no Brasil".

"Na prática, a população continua com o mesmo alto índice de intolerância que se reflete não só nos homicídios, mas no bullying ocorrido nas escolas, por exemplo. Existe toda uma homofobia cultural e institucional que ainda se mantém e que tem, nas igrejas evangélicas e católicas, os grandes centros de fabricação dessas munições ideológicas", argumenta.

Na avaliação do fundador do GGB, a situação dos LGBTs piorou ao longo dos oito anos de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Foram anos marcados por muitas declarações e ações afirmativas através do Programa Brasil sem Homofobia, da Conferência Nacional LGBT, da criação do Conselho Nacional LGBT. Porém, poucas propostas saíram do papel. As conquistas importantes, como nome social para travesti, são resultado de uma ou duas décadas de militância do movimento. Em termos concretos, a situação dos gays piorou, apesar da festa. Nunca tanto sangue homossexual foi derramado quanto no governo Lula. A contaminação por HIV aumentou também. Uma situação calamitosa. Apesar de toda boa vontade, declarações e programas, propostas e ações afirmativas, a esperança de vida dos homossexuais diminui", conclui.
Crítica
Mott critica o que chamou de "falta de vontade política": "há mais de uma dezena de leis no Congresso Nacional, orientadas para a cidadania homossexual. Para aprovar essas leis, é necessário vontade política e pressão do poder Executivo junto ao Legislativo. A bancada evangélica e a Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB) são extremamente homofóbicas e impedem a aprovação dessas propostas. Lula, infelizmente, não teve coragem e ousadia para pressionar sua base aliada, fazendo com que essas leis fossem aprovadas", dispara o ativista.

Luiz Mott enfatiza que os números compilados pelo GGB, baseados em notícias veiculadas na imprensa nacional, não traduzem o real quadro da violência contra homossexuais no Brasil. Para ele, os LGBT são as principais vítimas do ódio cultural, pois "não recebem apoio nem mesmo dentro de casa".

"No Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH 2), aprovado durante o governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), havia 11 medidas afirmativas que, infelizmente, o governo Lula não cumpriu. A primeira era documentação, a implementação de coleta sistemática de dados sobre violência, assassinatos de homossexuais. Não havendo no Brasil estatísticas oficiais de crime de ódio, que deveriam ser realizadas pelo Ministério da Justiça, Secretaria de Direitos Humanos nacional e dos estados, unicamente o GGB, com toda limitação de recursos é quem tem feito esse trabalho heroico. Com certeza, esse número é muito maior".

Mesmo com a subnotificação, o Brasil supera países como México, que é o segundo lugar no ranking de assassinatos de homossexuais (média de 35 casos/ano) e Estados Unidos, terceiro da lista (cerca de 25 notificações anuais), conforme Mott.

"Juntando todos os países onde há pena de morte para os homossexuais, as execuções não chegam a 20 por ano. O Brasil tem uma pena de morte diluída e, na prática, muito mais severa do que as praticadas nos países mais homofóbicos do mundo".
Avanço
O PNDH 3, aprovado por um decreto do presidente Lula como fruto da Conferência Nacional de Direitos Humanos, embora não tenha sido citado por Mott, também aponta medidas importantes para o movimento LGBT, como a união civil entre homossexuais, além de políticas afirmativas e de promoção de uma cultura de respeito à livre orientação sexual e identidade de gênero, promoção de ações voltadas à garantia do direito de adoção por casais homoafetivos, inclusão nos sistemas de informação do serviço público todas as configurações familiares dos LGBT, além de inclusão nos planos de saúde. Entidades do movimento LGBT de todo o país realizaram beijaços, marchas e manifestações das mais diversas em defesa da implementação plena do Plano.

Embora o documento não tenha caráter deliberativo - trata-se de um programa plurianual que propõe diretrizes e metas a serem implementadas em políticas públicas - algumas de suas medidas já estão sendo implementadas. Em que pese o PNDH 3 ter sido alvo de intensa campanha da velha mídia contra a sua aprovação, o Congresso aprovou o nome social para travestis e o Conselho Federal de Medicina (CFM) alterou as regras de reprodução assistida, permitindo que casais homossexuais possam ter filhos por meio da técnica de fertilização de embriões. Não são vitórias pequenas para o movimento. Entretanto, a conclusão de Luiz Mott de que o Brasil ainda é um país homofóbico é verdadeira e exige políticas públicas contundentes e imediatas, como a lei de criminalização da homofobia, pautada pelo movimento.

Mott adianta que o GGB estuda a possibilidade de denunciar o país em função do alto índice de homicídios de LGBT (em 2010, 65% das mortes foram de gays; 32%, de travestis e 3%, de lésbicas).

"No nosso entender, houve prevaricação por parte da Presidência da República por não ter efetivado as 11 medidas propostas pelo PNDH 2. O governo, apesar da boa vontade, não enfrentou o principal, que é a garantia de vida para os homossexuais. Havia previsão de medidas práticas que, se aplicadas, com certeza, teríamos um número mais preciso desses homicídios. Havia propostas para enfrentar a homofobia e os crimes letais".
Com informações do site Terra